Se você está inserido no contexto das healthtechs, ou tem acompanhado os principais veículos que cobrem saúde e tecnologia no mundo, já deve ter se deparado com o caso Theranos e Elizabeth Holmes, fundadora da empresa norte-americana de biotecnologia. Com a recente condenação de Holmes em quatro acusações na primeira semana de janeiro de 2022, e como Chief Product Officer e Cofundador na healthtech Neomed, resolvi levantar alguns aspectos importantes para aqueles que, assim como eu, atuam diretamente na criação e desenvolvimento de produtos voltados para a área da Saúde. Neste post, saiba quais lições para as healthtechs o caso Theranos e Elizabeth Holmes deixam.
Antes uma proeminente e poderosa empreendedora em saúde (sendo até chamada de “a nova Steve Jobs”), a fundadora da Theranos chamou atenção com a promessa de revolucionar a medicina diagnóstica por fazer diversos exames a partir de um pequeno volume de sangue. Em um escândalo que culminou em julgamento que durou meses, a empresária se encontra condenada por fraude perante investidores, pacientes e a opinião pública.
Pessoalmente, estou inserido no ecossistema de startups e inovação há mais de 10 anos, tendo trabalhado em diversos setores (MOOCs, CPaaS, VAS, SaaS e etc.). Uma das afirmações que mais foi “evangelizada” e escutei em todo esse período foi a doutrina do “Fake it until you make it”, “make things that don’t scale” e “Move fast and break things”, algo que já se provou efetivo em startups como Dropbox, Asana, Zappos, Meta. Porém, especialmente quando se trata da área da Saúde, essas premissas não funcionam dessa forma, por alguns motivos que destaco a seguir:
1. Errar na área da Saúde pode trazer consequências fatais
Por mais óbvio que pareça, sempre vale ressaltar: a Saúde é ancorada na vida: erros não podem ser tolerados e, se forem (como no caso da Theranos), as consequências podem ser fatais. Não à toa os ciclos de venda em saúde, as validações e os ciclos de crescimento são mais espaçados em relação a outras indústrias (como apontado neste incrível material da Bessemer Partners).
2. Empreender em Saúde demanda adaptação
Falo isso de forma pessoal. Após ter passado uma temporada em uma empresa de CPaaS (Plataforma de Comunicação como Serviço) fazendo produtos B2B, eu acreditava que seria muito parecido com a venda e o crescimento estando em uma healthtech. Doce ilusão. Mesmo vendendo e criando produtos para um problema concreto, ainda assim, o setor demanda muita adaptação e resiliência, pois os atores mudam muito. Por exemplo: clínicas populares, PPPs, Centros de diagnósticos, onde a fonte pagadora é a operadora de saúde e por aí vai.
Estar em um setor onde o “One Size Fits Most” pode não ser tão aplicável na Saúde, área na qual, por essência, demanda adaptações e iterações mais frequentes que em qualquer outra indústria. Isso demandará tempo e a sua escala esperada será mais demorada da que eu estava acostumado.
3. Faltam investidores com conhecimento, apetite e, principalmente, paciência no setor
Existem diversas regras que ajudam investidores a terem sinais de que a empresa analisada está no caminho de se tornar um unicórnio. Alguns dos mais famosos são o Product Market Fit, 2T3D (triple, triple, double, double, double), Curva S de maturidade de Produto e etc. Esses frameworks, porém, quando analisados dentro do setor de saúde (dado ao ponto 1) devem ser colocados em perspectiva.
Uma startup de marketplace pode não crescer no mesmo ritmo que o Mercado Livre, um SaaS para hospitais pode não ter seu crescimento de ARR igual a Salesforce ou Pipefy e, ainda assim, ter um crescimento enorme para o setor e para seu estágio de maturidade.
4. Criar produtos é difícil, especialmente em saúde
Validar é uma prática, nem tanto ciência e nem tanto arte. Qualquer pessoa que se aventure a ser um Gerente de Produto (a pessoa que vos fala sabe muito bem o que é isso) sabe o quanto é difícil o primeiro estágio. Mais difícil ainda é procurar os sinais em que a margem para erro é nula. Por isso, um bom gestor de produto em saúde não é aquele que vem com um playbook pronto, mas sim o que consegue adaptá-lo a este contexto.
Como fazemos na Neomed:
Nós temos como valor central da nossa empresa, desde o primeiro dia, colocar o Paciente no Centro. Com esse mantra em mente nós só vendemos e escalamos soluções que realmente são seguras e não apresentam falhas para pessoas que realmente irão se beneficiar da nossa solução.
Durante todo o processo, somos amparados por uma equipe científica médica, liderada pelo médico cardiologista Dr. Diandro Mota, que ativamente intervém, questiona e principalmente colabora para termos a tranquilidade de que as nossas soluções estão de acordo com o que é esperado e seguro.
Nossos sócios investidores nos empoderam e nos incentivam a criar as melhores soluções. Mesmo sabendo que a escala da Neomed é agressiva (3,7X de crescimento em um ano) eles tem certeza que o grande valor da nossa empresa ainda estará no longo prazo.
Assim, podemos correr e ser agressivos em crescimento, mas sem ter o estímulo errado e tropeçarmos no caminho. Aí vem a pergunta: ok Bruno, depois de tudo isso, como você conduz uma validação de produto em saúde? Bom, isso é assunto para um próximo post. =)
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Bruno Farias de Souza é Cofundador e Chief Product Officer na Neomed, healthtech brasileira que desenvolveu uma plataforma inteligente e integrada para reduzir a distância entre os sintomas e o tratamento. Bruno é graduado em administração de empresas (Universidade Metodista de São Paulo) e com especializações em Marketing (University of California) e Empreendedorismo e Inovação (Stanford University Graduate School of Business). Antes da Neomed, atuou por cerca de cinco anos na Movile, como Product Manager.